BNP e Inflamação Pulmonar: Para entendimento de Profissionais da Saúde e Interessados

Entenda o que é o exame BNP, como ele ajuda a diferenciar causas cardíacas e pulmonares de falta de ar, em quais doenças está elevado e por que se tornou importante na prática clínica e nas análises clínicas.

BIOQUÍMICA

Ariéu Azevedo Moraes

3/24/20256 min ler

pulmão em escala de maquete para estudo em anatomia
pulmão em escala de maquete para estudo em anatomia

BNP: o que é e como esse exame pode revelar muito mais do que problemas cardíacos

Quando o senhor João chegou ao pronto-socorro com falta de ar intensa e cansaço extremo, a primeira suspeita da equipe foi pulmonar: pneumonia, crise de DPOC, talvez um quadro infeccioso. Exames de imagem e laboratoriais iniciais ajudaram a descartar algumas hipóteses, mas foi um simples exame de sangue que mudou o rumo da investigação: o BNP.

O valor muito elevado do peptídeo natriurético tipo B (BNP) chamou a atenção e apontou para algo além dos pulmões: uma insuficiência cardíaca descompensada, já impactando a circulação pulmonar. Um marcador bioquímico, em poucos mililitros de sangue, revelou aquilo que o esteto e a radiografia ainda não deixavam totalmente claros.

Casos como o do senhor João se repetem diariamente nos serviços de saúde. Eles mostram como o BNP e o NT-proBNP se tornaram aliados valiosos não só na cardiologia, mas também na emergência, terapia intensiva, clínica médica e biomedicina, ajudando a diferenciar causas cardíacas e pulmonares de dispneia, a estratificar risco e a monitorar resposta ao tratamento.

Neste artigo, vamos explorar o que é o BNP, como ele é produzido no organismo, quais doenças ele pode indicar, quando o exame deve ser solicitado e por que esse marcador ganhou tanto espaço na rotina dos exames laboratoriais modernos.

O que é o BNP?

O BNP, sigla para Peptídeo Natriurético tipo B (Brain Natriuretic Peptide), é um hormônio produzido principalmente pelos ventrículos do coração quando há sobrecarga de pressão ou volume. Seu nome pode confundir — o termo “cerebral” vem da descoberta inicial em tecido cerebral, mas hoje sabemos que sua principal origem é cardíaca.

Quando o coração está trabalhando com dificuldade, seja por acúmulo de líquido ou aumento da pressão nas câmaras cardíacas, o BNP é liberado na corrente sanguínea como um sinal de alerta. Seu papel é ajudar o organismo a reduzir o volume de líquido e a pressão arterial, agindo como um “protetor” cardiovascular.

Para que serve o exame de BNP?

Tradicionalmente, o BNP é utilizado para avaliar e monitorar a insuficiência cardíaca, uma condição em que o coração perde sua capacidade de bombear sangue de forma eficaz. No entanto, nas últimas décadas, pesquisas vêm demonstrando que o BNP também pode indicar complicações pulmonares e inflamatórias, ampliando seu uso dentro das análises clínicas.

A surpreendente conexão entre BNP e pulmões

Quando a gente fala em BNP (peptídeo natriurético tipo B), a imagem mais comum vem direto: coração, insuficiência cardíaca, sobrecarga ventricular. Só que, nos bastidores da fisiologia, existe um detalhe que muda o raciocínio clínico: o BNP também pode “subir” quando o problema começa no pulmão.

Isso acontece porque coração e pulmões trabalham como uma dupla inseparável dentro do sistema cardiorrespiratório. O pulmão oxigena o sangue, mas também regula pressões e resistências do circuito pulmonar; o coração, por sua vez, precisa vencer essa resistência para manter o fluxo. Quando o pulmão inflama, obstrui ou perde capacidade de troca gasosa, o coração costuma pagar parte da conta — principalmente o ventrículo direito, que é quem lida diretamente com a circulação pulmonar.

Na prática, isso significa que processos pulmonares podem gerar estresse cardíaco secundário, levando a maior liberação de BNP. E é justamente por isso que, em alguns cenários, um BNP elevado não aponta apenas para “falência do coração” de forma isolada, mas para um quadro em que o pulmão participa ativamente do desequilíbrio.

Um exemplo clássico é a DPOC (Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica). Por ser uma doença inflamatória persistente, com obstrução das vias aéreas e alterações na dinâmica respiratória, ela pode aumentar a pressão no circuito pulmonar ao longo do tempo. Esse aumento de pressão sobrecarrega o coração direito e dificulta o bombeamento adequado, o que favorece a elevação do BNP — às vezes de forma significativa, principalmente quando há piora clínica ou hipertensão pulmonar associada.

A asma, especialmente nas crises mais intensas, também entra nesse radar. Durante uma exacerbação grave, a resistência ao fluxo de ar aumenta, a ventilação fica comprometida e o organismo passa a operar em “modo de esforço”. Dependendo do grau de hipoxemia, da pressão intratorácica e do impacto hemodinâmico, pode haver interferência no retorno venoso e na carga de trabalho cardíaca. Esse contexto de estresse pode estimular a liberação de BNP, não como causa primária cardíaca, mas como resposta do organismo a uma situação crítica.

Já na pneumonia, o caminho é outro: a inflamação intensa no tecido pulmonar, somada à febre, hipóxia e resposta sistêmica, pode gerar um estado de demanda aumentada e estresse cardiovascular secundário. Em outras palavras, a infecção “puxa” o corpo inteiro para uma resposta de alto consumo — e o coração, novamente, entra no jogo. BNP pode subir como reflexo dessa sobrecarga indireta, principalmente em pacientes mais idosos, com comorbidades ou com reserva cardiopulmonar limitada.

E quando o cenário evolui para algo mais grave, como a SDRA (Síndrome do Desconforto Respiratório Agudo) — muitas vezes associada a sepse ou a infecções virais importantes (como a COVID-19) — o quadro ganha outra dimensão. A SDRA causa lesão pulmonar difusa, altera profundamente a oxigenação e impõe um estresse gigantesco ao sistema cardiopulmonar. Nesses casos, o BNP pode aparecer como um biomarcador que acompanha gravidade e resposta inflamatória, ajudando a compor o quebra-cabeça clínico junto com gasometria, marcadores inflamatórios e avaliação hemodinâmica.

No fim das contas, a mensagem mais útil para o raciocínio laboratorial é simples: BNP elevado não é uma frase pronta — é uma pista. E, às vezes, essa pista aponta para o pulmão puxando o coração para o limite.

O BNP como possível agente protetor dos pulmões

Além de atuar como um marcador de inflamação, o BNP pode exercer efeitos benéficos diretos sobre os pulmões:

  • Ação anti-inflamatória: estudos experimentais sugerem que o BNP reduz a produção de citocinas inflamatórias em modelos de lesão pulmonar [5].

  • Proteção do tecido pulmonar: ao limitar a inflamação, o BNP pode prevenir danos permanentes ao epitélio respiratório.

  • Melhoria da função pulmonar: em alguns casos, o BNP foi associado à redução de edema pulmonar e melhora da oxigenação.

Essas descobertas abrem caminho para futuras terapias com análogos de BNP em doenças pulmonares crônicas.

Como é feito o exame de BNP?

O exame de BNP é realizado por meio de coleta de sangue venoso, geralmente do braço, em um procedimento simples e rápido. O material é analisado em laboratório por métodos imunológicos, como o quimioluminescência.

Precisa de jejum?

Na maioria dos casos, não é necessário jejum para a realização do BNP. No entanto, o ideal é seguir as orientações específicas do seu médico ou do laboratório onde será feita a coleta.

Valores de referência do BNP

Os valores de referência podem variar de acordo com o método e o laboratório, mas geralmente seguem este padrão:

  • Menor que 100 pg/mL: considerado normal.

  • Entre 100 e 400 pg/mL: requer avaliação clínica, podendo indicar insuficiência cardíaca ou condições inflamatórias.

  • Acima de 400 pg/mL: sugestivo de insuficiência cardíaca descompensada ou doença grave.

Esses valores devem ser interpretados por um médico, levando em conta idade, sexo, função renal e uso de medicamentos como diuréticos ou inibidores da ECA.

O BNP está disponível no SUS?

Sim! Desde 2020, o exame de BNP passou a ser ofertado pelo Sistema Único de Saúde (SUS), facilitando o acesso ao diagnóstico precoce da insuficiência cardíaca, principalmente em populações de maior vulnerabilidade.

O que mais pode alterar o BNP?

Além da insuficiência cardíaca e das doenças pulmonares inflamatórias, os níveis de BNP podem se elevar em outras situações clínicas:

  • Doença renal crônica

  • Hipertensão arterial sistêmica

  • Embolia pulmonar

  • Hipertensão pulmonar

  • Infarto do miocárdio

  • Arritmias e valvopatias cardíacas

Em todos esses casos, o BNP atua como marcador de estresse cardíaco e pode orientar condutas clínicas mais precisas.

Temos então:

O BNP é muito mais do que um exame para o coração. Ele se tornou um biomarcador multidisciplinar, essencial em cenários de insuficiência cardíaca, inflamação pulmonar e outras doenças sistêmicas.

Para os profissionais da biomedicina, o BNP representa uma ferramenta laboratorial estratégica, capaz de auxiliar diagnósticos complexos e monitorar o tratamento de forma eficaz. Seu acesso ampliado pelo SUS, a simplicidade da coleta e a riqueza de informações tornam o BNP um dos exames mais relevantes da medicina moderna.

Lembre-se: mesmo com todo o avanço tecnológico, nenhum exame substitui a avaliação clínica completa. Por isso, converse sempre com seu médico sobre os resultados e sobre o que eles significam no seu caso específico.

Referências:

  1. BNP in asthma: clinical correlation

  2. Anti-inflammatory effects of natriuretic peptides

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