Por que não se deve administrar potássio em pacientes com infecção?
O potássio é vital para o organismo, mas sua administração em pacientes com infecção pode trazer riscos graves, como favorecer bactérias, prejudicar a imunidade e causar hipercalemia. Entenda por que o cuidado é essencial.
BIOQUÍMICA
Ariéu Azevedo Moraes
9/14/20254 min ler


Por que não se deve administrar potássio em pacientes com infecção?
Não se deve administrar potássio em excesso em pacientes com infecção porque ele pode atuar como nutriente para bactérias, prejudicar a ativação do inflamassoma e da resposta imune e aumentar o risco de hipercalemia, complicação grave em pacientes críticos.
Potássio: um eletrólito vital, mas delicado
O potássio (K⁺) é o principal cátion intracelular, presente em concentrações cerca de 30 vezes maiores dentro das células do que no plasma. Ele participa de funções vitais, como:
Contração muscular e cardíaca
Condução elétrica no sistema nervoso
Equilíbrio ácido-básico
Osmolaridade celular
Esse delicado equilíbrio é regulado, principalmente, pelos rins. Mesmo pequenas alterações podem gerar arritmias fatais, por isso a monitorização laboratorial é tão importante.
Quando pensamos em pacientes com infecção, sepse ou internados em UTI, a questão se torna ainda mais crítica. Nesses cenários, a administração de potássio precisa ser avaliada com extremo cuidado.
Caso clínico: o paciente que piorou após a reposição de potássio
Imagine a seguinte situação, inspirada em casos comuns da rotina hospitalar:
Um homem de 62 anos, portador de diabetes e hipertensão, deu entrada no pronto-socorro com quadro de febre, confusão mental e sinais de infecção urinária complicada. Os exames laboratoriais mostraram leucocitose, creatinina elevada e potássio sérico levemente baixo (3,3 mEq/L).
Na tentativa de corrigir rapidamente a hipocalemia, a equipe iniciou reposição endovenosa de potássio. Horas depois, o paciente evoluiu com bradicardia e necessidade de monitorização intensiva. Uma nova coleta revelou hipercalemia grave (6,2 mEq/L) associada à piora da função renal.
Além disso, a infecção bacteriana tornou-se mais resistente ao tratamento, exigindo antibioticoterapia de amplo espectro.
Esse exemplo ilustra como a reposição inadvertida de potássio em pacientes infectados pode ter consequências desastrosas, tanto pela alteração do equilíbrio eletrolítico quanto pela interação com a própria resposta imunológica e o crescimento bacteriano.
Potássio como nutriente bacteriano
As bactérias, assim como nossas células, necessitam de potássio para sobreviver. Esse cátion é utilizado para:
Manutenção do equilíbrio osmótico
Produção de energia
Formação de biofilmes
Ativação de genes de virulência
Isso significa que, ao fornecer potássio em excesso, podemos fortalecer o inimigo, tornando a infecção mais agressiva e resistente a antimicrobianos.
Um exemplo relevante é observado em Staphylococcus aureus e Pseudomonas aeruginosa, bactérias que formam biofilmes resistentes em cateteres e dispositivos hospitalares. A disponibilidade de potássio é um dos fatores que favorece essa adaptação.
Potássio e a resposta imune
O sistema imunológico depende do fluxo de íons para funcionar adequadamente. A ativação do inflamassoma — principalmente os complexos NLRP3 e NLRC4 — exige a saída de potássio das células de defesa.
Esse efluxo de potássio é interpretado como um “sinal de perigo”, estimulando a liberação de citocinas pró-inflamatórias como:
Interleucina-1β (IL-1β)
Interleucina-18 (IL-18)
Quando há muito potássio no meio extracelular (hipercalemia), esse gradiente de saída se reduz e o inflamassoma não é ativado adequadamente. Resultado:
Resposta imune prejudicada
Menor liberação de citocinas pró-inflamatórias
Maior dificuldade de combater microrganismos
Ou seja, o excesso de potássio pode enfraquecer as defesas do corpo justamente quando ele mais precisa estar em alerta.
Risco de hipercalemia em pacientes críticos
Pacientes com sepse ou infecções graves já apresentam risco aumentado de hipercalemia devido a:
Comprometimento renal (diminuição da filtração glomerular)
Acidose metabólica (que desloca potássio do meio intracelular para o plasma)
Lise celular (liberação de potássio intracelular no sangue)
Nesses casos, a suplementação adicional de potássio pode desencadear complicações fatais:
Arritmias ventriculares
Bradicardia
Parada cardíaca
Maior mortalidade hospitalar
Por isso, em pacientes críticos, o monitoramento frequente da calemia (nível sérico de potássio) é indispensável.
Comparando o potássio a outros eletrólitos
O caso do potássio não é isolado. Outros eletrólitos também sofrem impacto durante infecções:
Sódio (Na⁺): distúrbios como hiponatremia são comuns em sepse, especialmente pela síndrome da secreção inapropriada de ADH (SIADH).
Cálcio (Ca²⁺): hipocalcemia é frequente em pacientes sépticos e está associada à piora da contratilidade cardíaca.
Entretanto, o potássio se destaca porque seu excesso ou falta pode levar a arritmias imediatas, tornando seu manejo ainda mais delicado.
Papel do laboratório clínico
O laboratório é peça-chave na segurança do paciente. Entre os exames laboratoriais indispensáveis em pacientes infectados estão:
Potássio sérico (avaliar hipocalemia ou hipercalemia)
Ureia e creatinina (função renal)
Gasometria arterial (equilíbrio ácido-básico)
CK e DHL (marcadores de lise celular)
Além disso, o acompanhamento seriado permite identificar rapidamente alterações bruscas, antecipando condutas médicas.
Considerações clínicas
Nem todo paciente deve evitar potássio. Se a hipocalemia for grave, a reposição é necessária, mas de forma monitorada.
O problema é o excesso. Suplementar potássio sem avaliar o quadro clínico pode piorar a infecção e aumentar o risco de complicações.
Monitoramento constante é essencial. Pacientes sépticos e críticos exigem controle rigoroso dos eletrólitos.
O potássio é indispensável à vida, mas em pacientes com infecção sua administração deve ser feita com cautela redobrada.
Ele pode favorecer bactérias e tornar a infecção mais agressiva.
Pode prejudicar a resposta imune, dificultando o combate aos microrganismos.
E aumenta o risco de hipercalemia, complicação potencialmente fatal.
Por isso, em contextos infecciosos e críticos, a avaliação laboratorial é essencial antes de qualquer decisão terapêutica.
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Referências
NCBI – Potassium in Bacterial Physiology
Nature Reviews Immunology – Potassium efflux and inflammasome activation
World Journal of Critical Care Medicine – Potassium disorders in critically ill patients
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