Gestão da Qualidade em Laboratórios: Como Evitar Erros Pré-analíticos

Entenda como a gestão da qualidade reduz erros pré-analíticos no laboratório clínico. Veja falhas comuns na coleta, identificação e transporte de amostras e estratégias práticas para evitar retrabalho e resultados inválidos.

COLETA E PREPAROCONSULTORIA E GESTÃO BIOMÉDICA

Ariéu Azevedo Moraes

5/7/20254 min ler

homens usando computador em reunião
homens usando computador em reunião

A qualidade de um exame não começa no equipamento — ela começa na coleta.


Em um laboratório clínico, a busca pela excelência não se limita à tecnologia, aos reagentes ou à validação final do laudo. Muito antes da etapa analítica existe um território silencioso, mas decisivo: a fase pré-analítica. É nela que se concentram a maioria das falhas do processo, envolvendo desde o preparo do paciente até coleta, identificação, acondicionamento, armazenamento e transporte das amostras.

Na prática, isso significa que um exame pode ser comprometido mesmo com analisadores impecavelmente calibrados e uma equipe altamente capacitada. Quando uma variável pré-analítica foge do padrão, o resultado deixa de refletir a realidade clínica do paciente — e passa a refletir a falha do processo.

Foi o que aconteceu com Carla, técnica de enfermagem experiente. Ela colheu sangue de um paciente em jejum, mas deixou os tubos por duas horas fora da temperatura ideal antes do envio ao laboratório. O impacto foi imediato: hemólise, interferência analítica e um falso alarme de hiperpotassemia, gerando retrabalho, insegurança clínica e risco de condutas desnecessárias.

Situações como essa são mais comuns do que se imagina. E o alerta é simples: gestão da qualidade pré-analítica não é detalhe operacional — é segurança do paciente.

Neste artigo, você vai entender como os laboratórios podem reduzir erros pré-analíticos, fortalecer rotinas de coleta e garantir resultados mais confiáveis, consistentes e alinhados às melhores práticas da medicina laboratorial.

O que é a fase pré-analítica e por que ela é tão crítica?

A fase pré-analítica compreende todas as etapas que antecedem a análise propriamente dita: solicitação do exame, preparo do paciente, coleta, identificação, armazenamento e transporte da amostra. Essa fase responde por até 70% dos erros em exames laboratoriais, conforme dados da Organização Mundial da Saúde (OMS).

Mesmo com equipamentos de última geração e análises automatizadas, se houver falha na etapa anterior, o resultado final pode ser inválido, com sérias consequências para o diagnóstico clínico.

Tipos mais comuns de erros pré-analíticos - imagem em anexo.

Coleta inadequada

Entre os principais erros estão a coleta em tubo errado, volume insuficiente, uso incorreto da ordem dos tubos ou até mesmo coleta sem preparo adequado do paciente, como jejum ou suspensão de medicamentos.

Identificação incorreta do paciente

Erro gravíssimo e infelizmente ainda frequente, especialmente em ambientes com alta demanda. A falta de dupla conferência da identidade pode levar à troca de amostras e diagnósticos equivocados.

Armazenamento e transporte fora do padrão

A temperatura ideal, tempo de transporte e exposição à luz influenciam diretamente a integridade de muitos exames, especialmente os de bioquímica e hormônios.

Tabela em anexo: Tipos de Erros Pré-analíticos e Medidas Preventivas

Como a gestão da qualidade atua na fase pré-analítica?

POPs e protocolos de coleta

A implementação de Procedimentos Operacionais Padrão (POPs) é essencial para padronizar as etapas, desde a recepção até a liberação da amostra. Eles garantem a repetibilidade e reduzem a variabilidade de ações entre os profissionais.

Treinamento e capacitação contínua

A educação permanente da equipe técnica, incluindo coleta externa e interna, é parte central da gestão da qualidade. Simulados, checklists e reciclagens frequentes são medidas recomendadas pelas normas ISO 15189 e RDC 786/2023 da Anvisa.

Monitoramento de indicadores de erro

Indicadores como taxa de hemólise, rejeição de amostras por volume inadequado ou falha na identificação devem ser mensurados, analisados e discutidos em reuniões periódicas, com ações corretivas e preventivas implementadas.

Ferramentas e normas para garantir a qualidade laboratorial

A norma ISO 15189:2022 é o principal guia internacional para laboratórios clínicos, estabelecendo requisitos de qualidade e competência técnica. No Brasil, a RDC 786/2023 reforça a necessidade de qualidade em todas as fases do processo laboratorial.

Outras ferramentas importantes incluem:

  • Mapeamento de processos com fluxogramas

  • Fichas de não conformidade

  • Checklists de rastreabilidade

  • Relatórios de auditoria interna e externa.

Impactos clínicos e financeiros dos erros pré-analíticos

Erros nessa fase podem:

  • Levar a diagnósticos errôneos ou atrasados

  • Gerar recoleta e desconforto ao paciente

  • Aumentar os custos operacionais com desperdício de reagentes

  • Comprometer a reputação do laboratório

Estudos apontam que os custos diretos de erros pré-analíticos podem representar até 2% do faturamento mensal de laboratórios privados.

Como implementar uma cultura de qualidade no laboratório

  • Envolver a equipe desde a recepção até a área técnica

  • Fomentar a notificação de não conformidades sem punição

  • Estabelecer objetivos e metas de qualidade claros

  • Realizar auditorias internas periódicas

  • Promover o engajamento com o paciente, explicando orientações pré-exame.

Os erros pré-analíticos são responsáveis por até 70% das falhas em exames laboratoriais. Para evitá-los, laboratórios devem investir em protocolos padronizados, treinamentos contínuos, controle de temperatura e rastreabilidade de amostras, seguindo normas como a ISO 15189 e a RDC 786/2023.

Finalizamos assim:

A qualidade de um exame laboratorial começa muito antes do tubo chegar ao equipamento. Investir na fase pré-analítica é investir em segurança, confiabilidade e ética profissional. Com uma gestão da qualidade bem estruturada, os laboratórios fortalecem sua credibilidade e contribuem para diagnósticos mais precisos e decisões clínicas acertadas.

Texto elaborado por Biomédico Ariéu Azevedo Moraes, especialista em Gestão Laboratorial.

Referências

  1. World Health Organization – Laboratory Quality Management System

  2. ISO 15189:2022 - Medical laboratories — Requirements for quality and competence

  3. ANVISA – RDC nº 786/2023

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