Hemoglobina glicada x glicemia de jejum: quando concordam, quando divergem e o que isso revela no diagnóstico do diabetes

HbA1c e glicemia de jejum podem divergir no mesmo paciente — e isso muda o diagnóstico do diabetes tipo 2. Veja por que a correlação entre esses dois exames é tão relevante e o que cada um revela sobre o risco metabólico.

ATUALIDADESBIOQUÍMICA

Ariéu Azevedo Moraes

7/23/20254 min ler

Biomédica enfrente ao monitor com tubos de ensaio
Biomédica enfrente ao monitor com tubos de ensaio

Quantas vezes um exame de rotina revelou algo que o paciente nem suspeitava?

HbA1c e glicemia de jejum nem sempre contam a mesma história — e essa divergência é um dos pontos mais importantes no diagnóstico do diabetes tipo 2. A hemoglobina glicada reflete a média dos últimos 3 meses, enquanto a glicemia mostra o valor “do momento”. É por isso que pacientes podem ter glicemia normal e HbA1c alterada — e, nesse cenário, o risco metabólico já está instalado mesmo sem sintoma óbvio.

Foi essa diferença que motivou o estudo que orientei com Regiane de Brito Moreira, Rita Mendes e Wanderlei Schmitz, no Hospital Universitário de Dourados-MS, o objetivo: investigar a correlação entre dois dos exames mais solicitados no diagnóstico do diabetes mellitus tipo 2 — a glicemia de jejum e a hemoglobina glicada (HbA1c).

O artigo foi publicado na RBAC p.24 – Revista Brasileira de Análises Clínicas (2019).

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Por que estudar essa correlação?

A glicemia de jejum é tradicionalmente usada para triagem do diabetes. Já a HbA1c, por refletir os níveis médios de glicose ao longo dos últimos 2 a 3 meses, fornece uma visão mais ampla do controle glicêmico.

A hemoglobina glicada (HbA1c) mostra forte correlação com a glicemia de jejum e pode identificar casos de diabetes tipo 2 que passariam despercebidos. O estudo revelou que 18,1% dos pacientes tinham HbA1c alterada mesmo com glicemia normal, reforçando a importância de usar os dois exames em conjunto.

Mas o que acontece quando esses dois exames não dizem a mesma coisa?

Foi o que descobrimos ao analisar 360 pacientes com diagnóstico confirmado de DM2. O estudo agrupou os pacientes em quatro perfis diferentes, combinando os níveis de glicemia e HbA1c — e os resultados foram surpreendentes.

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Resultados que chamam a atenção

Dos 360 pacientes analisados:

  • 277 (77%) apresentaram tanto glicemia quanto HbA1c alteradas.

  • 65 tinham HbA1c elevada e glicemia normal.

  • Apenas 3 tinham glicemia elevada e HbA1c normal.

  • E outros 15 estavam com ambos os parâmetros normais.

A maior surpresa? Cerca de 18% dos pacientes diabéticos teriam passado despercebidos se a única referência fosse a glicemia de jejum.

Além disso, a análise estatística revelou uma forte correlação entre os dois exames (r = 0,7886), mas com nuances que não podem ser ignoradas.

O que isso muda na prática clínica?

Essa discrepância entre os exames reforça um ponto defendido por instituições como a ADA – American Diabetes Association: a hemoglobina glicada deve fazer parte do diagnóstico e não apenas do acompanhamento.

Um paciente com glicemia de jejum normal pode estar, silenciosamente, em um processo de glicação crônica das hemácias, e esse dano só será percebido meses depois, quando complicações como neuropatias, retinopatias ou eventos cardiovasculares já estiverem em curso.

História real por trás do artigo

Este artigo nasceu dentro de um laboratório-escola e contou com a dedicação de alunos, técnicos e profissionais que lidam com os desafios diários do SUS. A orientanda Regiane, hoje profissional atuante, conduziu com excelência a parte técnica da coleta e tabulação dos dados, enfrentando todos os obstáculos que uma pesquisa aplicada carrega — desde a padronização dos kits até as análises estatísticas.

Foi uma experiência que, além do conhecimento científico, reforçou nosso compromisso com a formação de profissionais que pensam o exame além do tubo de ensaio.

Então qual exame solicitar?

📌 Se você atua com exames laboratoriais ou cuida de pacientes com risco de diabetes, considere solicitar glicemia de jejum e HbA1c em conjunto. Essa prática pode aumentar em até 18% a detecção de pacientes com alteração glicêmica e reduzir atrasos no início do tratamento.

📌 Para gestores de laboratórios: inclua o painel glicêmico completo em campanhas de rastreio e check-ups.

📌 Para profissionais da saúde pública: integrar esses marcadores nos protocolos de atenção primária pode evitar complicações de alto custo para o sistema e sofrimento para o paciente.

Referência do estudo:

Moreira RB, Moraes AA, Mendes RCD, Schmitz WO. Correlação da hemoglobina glicada com a glicemia de jejum no diagnóstico do diabetes mellitus. RBAC. 2019;51(1 supl.1):S24-9. Disponível em: https://www.rbac.org.br

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