Parasitas que causam eosinofilia: o que o hemograma pode indicar?

Entenda como parasitas podem causar eosinofilia, o que o hemograma revela nesses casos e como interpretar esse achado em diferentes contextos clínicos com apoio laboratorial.

Ariéu Azevedo Moraes

7/4/20254 min ler

Parasita em 3D
Parasita em 3D

🧫 Parasitas que causam eosinofilia: o que o hemograma pode indicar?

Introdução

Quando um paciente apresenta aumento de eosinófilos no hemograma, a primeira suspeita costuma recair sobre alergias ou doenças autoimunes. No entanto, em muitas situações — especialmente em países tropicais como o Brasil — essa alteração hematológica pode esconder um parasitismo ativo, às vezes silencioso e prolongado.

A eosinofilia induzida por parasitas é um sinal de que o organismo está tentando combater um agente estranho, principalmente vermes com ciclo tissular. Entender esse mecanismo, reconhecer os padrões laboratoriais e saber correlacionar os dados é essencial para clínicos, infectologistas e analistas do laboratório.

Quais parasitas causam eosinofilia?
Os principais parasitas que causam eosinofilia são os helmintos com fase de migração tecidual, como Strongyloides stercoralis, Ascaris lumbricoides, Ancylostoma duodenale, Toxocara canis e Schistosoma mansoni. Protozoários raramente induzem eosinofilia significativa.

O que é eosinofilia e quando ela preocupa?

Eosinofilia é definida como o aumento absoluto de eosinófilos acima de 500 células/µL no sangue periférico. Essas células pertencem ao grupo dos leucócitos e têm papel ativo na defesa contra parasitas, além de participarem de processos alérgicos e inflamatórios.

Em geral, a eosinofilia pode ser classificada em:

  • Leve: 500–1500 células/µL

  • Moderada: 1500–5000 células/µL

  • Grave: >5000 células/µL

Eosinofilia leve isolada pode passar despercebida. Mas se for persistente ou associada a sintomas, deve sempre ser investigada.

Parasitas que causam eosinofilia: os principais suspeitos

Nem todos os parasitas causam eosinofilia. Esse achado é mais comum em infecções por helmintos (vermes), especialmente os que possuem fase de migração pelos tecidos, estimulando o sistema imunológico de forma intensa.

Entre os principais agentes parasitários associados a eosinofilia estão:

  • Strongyloides stercoralis: provoca eosinofilia intermitente, às vezes acentuada. A hiperinfecção em imunossuprimidos pode ser fatal.

  • Ascaris lumbricoides: durante a fase pulmonar (síndrome de Loeffler), o número de eosinófilos se eleva.

  • Ancylostoma duodenale / Necator americanus: penetram ativamente pela pele, com alta estimulação eosinofílica.

  • Schistosoma mansoni: na fase aguda (febre de Katayama), a eosinofilia pode ser marcante.

  • Toxocara canis (toxocaríase): classicamente associada a eosinofilia persistente e hepatomegalia.

  • Trichinella spiralis: raro no Brasil, mas relevante em surtos alimentares com eosinofilia e mialgia.

Protozoários como Giardia e Entamoeba não costumam causar eosinofilia, pois permanecem no lúmen intestinal e não invadem tecidos.

O que o hemograma pode revelar nesses casos?

O hemograma é uma ferramenta fundamental na triagem de pacientes com suspeita de parasitose. Mesmo quando o exame de fezes não detecta o agente (como ocorre com frequência em estrongiloidíase), o hemograma pode acender o alerta.

Além da eosinofilia isolada, o profissional deve observar:

  • Leucocitose com eosinofilia: em quadros inflamatórios intensos

  • Anemia associada: comum em parasitas hematófagos (ex: ancilostomíase)

  • Plaquetopenia leve: ocasional em infecções sistêmicas por helmintos

A interpretação exige olhar atento aos dados clínicos e epidemiológicos do paciente, como exposição a áreas rurais, uso de água não tratada, andar descalço, ingestão de carne malcozida e viagens recentes.

Diagnóstico complementar: quando o hemograma não basta

O hemograma com eosinofilia é apenas o início. O diagnóstico definitivo costuma exigir a associação com:

  • Exame parasitológico de fezes (EPF) seriado

  • Método de Baermann-Moraes (para larvas de Strongyloides)

  • Pesquisa de anticorpos anti-Toxocara por ELISA

  • Eosinófilos no lavado broncoalveolar, em pacientes com pneumonite eosinofílica

  • Biópsia de tecidos ou aspirado de medula, em casos graves e persistentes

Em muitos casos, a sorologia é mais sensível que o exame de fezes, especialmente quando a carga parasitária é baixa ou o parasita está em tecidos.

Situações clínicas que merecem atenção

  • Eosinofilia persistente (>6 semanas) sem diagnóstico

  • Imunossuprimidos com eosinofilia inexplicada (risco de hiperinfecção por Strongyloides)

  • Pacientes com queixas de mialgia, dor abdominal, febre e lesões cutâneas migratórias

  • Quadros respiratórios com eosinofilia (síndrome de Loeffler ou eosinofilia pulmonar tropical)

Nesses cenários, o laboratório deve orientar a coleta de exames adicionais e sinalizar no laudo a possibilidade de parasitose.

O papel do laboratório clínico e da correlação com o hemograma

Cabe ao profissional do laboratório não apenas liberar os números do hemograma, mas sinalizar achados relevantes que merecem investigação. A menção de eosinofilia importante e sua associação com parasitas deve constar de forma clara e padronizada.

Além disso, a correlação com exames complementares, como parasitológicos e sorológicos, deve ser sugerida em casos típicos, mesmo que não tenha sido solicitado no pedido inicial.

O laboratório é uma extensão do raciocínio clínico. Um hemograma interpretado com contexto pode ser a diferença entre um diagnóstico precoce e um erro de conduta.

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Conclusão

A presença de eosinofilia no hemograma não deve ser ignorada. Em países como o Brasil, onde as parasitoses ainda são prevalentes, esse achado pode ser o primeiro indício de uma infecção insidiosa que, se não tratada, pode gerar complicações graves.

O papel do laboratório, nesse contexto, vai muito além da análise técnica. Exige sensibilidade clínica, correlação com outros exames e, acima de tudo, atenção aos detalhes que o sangue revela silenciosamente.

Quando o hemograma aponta eosinofilia, o corpo está pedindo ajuda. Cabe ao profissional da saúde ouvir — e agir.

Texto elaborado por Biomédico Ariéu Azevedo Moraes, especialista em Gestão Laboratorial

Referências

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