Ureia no exame de sangue: o que significa quando está alta ou baixa?

Entenda o que a ureia no sangue revela sobre rins, fígado, hidratação e metabolismo. Veja causas de ureia alta, baixa, relação com a creatinina e interpretação clínica segura.

BIOQUÍMICA

Ariéu Azevedo Moraes

12/7/20256 min ler

Representação de um laboratório e tubos de coleta para uréia
Representação de um laboratório e tubos de coleta para uréia

Ureia: o que o exame realmente revela sobre rins, fígado e metabolismo

A ureia está entre os exames mais solicitados da rotina laboratorial. Presente em check-ups, avaliações de função renal, quadros de desidratação, internações e emergências, ela costuma ser associada quase exclusivamente ao funcionamento dos rins. Mas essa é apenas uma parte da história.

Na prática, a ureia reflete um elo direto entre fígado, metabolismo proteico, volume sanguíneo e excreção renal. Interpretá-la corretamente exige olhar além do valor isolado no laudo e integrar dados clínicos, bioquímicos e até nutricionais.

O que é a ureia e por que ela existe no nosso organismo?

A ureia é o principal produto final do metabolismo das proteínas. Sempre que consumimos alimentos ricos em proteínas — carnes, ovos, leite, leguminosas — ocorre a liberação de nitrogênio durante a quebra desses nutrientes. Esse nitrogênio, em forma de amônia, é altamente tóxico para o organismo.

É no fígado que entra em ação o chamado ciclo da ureia, um mecanismo bioquímico fundamental que transforma a amônia em ureia, uma substância bem menos tóxica. Depois disso, a ureia é lançada na corrente sanguínea e eliminada principalmente pelos rins, através da urina.

Ou seja, qualquer alteração relevante nesse caminho — fígado, circulação, rins ou ingestão proteica — pode interferir diretamente nos valores da ureia.

A ureia é um marcador indireto da função renal, mas também reflete hidratação, metabolismo proteico e função hepática, devendo sempre ser interpretada em conjunto com a creatinina.

Para que serve o exame de ureia?

O exame de ureia é utilizado para:

  • Avaliar função renal

  • Monitorar estado de hidratação

  • Auxiliar no acompanhamento de doenças hepáticas

  • Avaliar catabolismo proteico

  • Monitorar pacientes críticos, em UTI

  • Acompanhar resposta a tratamentos e uso de certos medicamentos

Ele raramente deve ser avaliado sozinho. Em geral, entra como parte do painel junto com creatinina, eletrólitos, ácido úrico e gasometria, dependendo do contexto.

Valores de referência da ureia

Os valores podem variar entre laboratórios, mas geralmente ficam em torno de:

  • Adultos: 10 a 50 mg/dL

  • Crianças: levemente mais baixos

  • Idosos: podem apresentar discretas elevações fisiológicas

Mais importante do que decorar números é entender o significado clínico das variações.
A ureia pode se alterar por:

  • Desidratação

  • Insuficiência renal

  • Doença hepática grave

  • Dietas hiperproteicas

  • Hemorragias extensas

  • Uso de corticoides

  • Estados hipercatabólicos

Ureia elevada: o que pode estar por trás?

Quando a ureia está alta, o termo técnico é uremia (ou azotemia, quando associada a outros compostos nitrogenados). Mas nem toda ureia elevada significa diretamente falência renal. Existem três grandes grupos de causas:

1. Causas pré-renais (antes dos rins)

Aqui, os rins estão estruturalmente íntegros, mas recebem menos fluxo sanguíneo. Isso reduz a filtração e faz a ureia se acumular.
Principais exemplos:

  • Desidratação

  • Vômitos e diarreia intensos

  • Hemorragias

  • Choque

  • Uso excessivo de diuréticos

  • Insuficiência cardíaca

Nessas situações, a ureia sobe mais do que a creatinina, e a relação ureia/creatinina costuma se elevar.

2. Causas renais (dentro dos rins)

Quando o próprio rim perde a capacidade de filtrar adequadamente, a ureia se eleva junto com a creatinina.
Exemplos:

  • Insuficiência renal aguda

  • Doença renal crônica

  • Glomerulonefrites

  • Nefrotoxicidade por medicamentos

Aqui, tanto a ureia quanto a creatinina sobem de forma mais proporcional.

3. Causas pós-renais (depois dos rins)

O problema está na saída da urina.
Exemplos:

  • Cálculos urinários

  • Hiperplasia prostática

  • Tumores

  • Obstruções do trato urinário

O rim até filtra, mas a urina não consegue ser eliminada adequadamente.

Outros fatores que elevam a ureia

  • Dietas muito ricas em proteínas

  • Uso de corticoides

  • Infecções graves

  • Estados hipercatabólicos

  • Queimaduras extensas

Ureia baixa: quando o valor chama atenção?

A ureia baixa recebe menos destaque clínico, mas também carrega significado. Ela pode estar reduzida em situações como:

  • Doenças hepáticas graves, em que o fígado perde a capacidade de produzir ureia

  • Desnutrição proteica

  • Dietas muito restritivas

  • Hiper-hidratação

  • Gravidez (por aumento do volume plasmático)

Em especial, ureia baixa associada a sinais de insuficiência hepática é um achado relevante, pois indica falha no ciclo da ureia.

Ureia e creatinina: por que esses dois exames andam juntos?

A creatinina é um marcador mais específico da função renal. Já a ureia sofre influência de múltiplos fatores. Por isso, os dois exames se complementam.

  • Ureia alta + creatinina normal: pensar em desidratação ou causa pré-renal

  • Ureia alta + creatinina alta: pensar em causa renal

  • Ureia muito alta desproporcional à creatinina: pensar em sangramento digestivo alto ou catabolismo intenso

Essa análise integrada evita interpretações equivocadas.

Ureia na prática clínica hospitalar

Em ambientes hospitalares, especialmente em enfermarias e UTIs, a ureia funciona como:

  • Marcador de perfusão renal

  • Indicador indireto de estado volêmico

  • Parâmetro de monitoramento de resposta ao tratamento

  • Apoio na avaliação de sepse, choque e falência múltipla de órgãos

Sua variação diária pode indicar melhora, piora ou instabilidade clínica.

Ureia e alimentação: a dieta interfere no exame?

Sim. A alimentação tem influência direta sobre os níveis de ureia.

  • Dietas hiperproteicas podem elevar a ureia

  • Dietas hipoproteicas podem reduzir a ureia

  • Jejuns prolongados também alteram o valor

Por isso, ao interpretar o exame, é essencial considerar:

  • Padrão alimentar do paciente

  • Uso de suplementos proteicos

  • Situações de dieta restritiva

Ureia na gestação

Durante a gravidez, é comum observar valores discretamente reduzidos de ureia, especialmente no segundo e terceiro trimestres. Isso ocorre devido ao aumento do volume plasmático e à maior demanda metabólica. Nesse contexto, ureia baixa não indica doença obrigatoriamente.

Interferências laboratoriais

Alguns fatores podem interferir na dosagem da ureia:

  • Hemólise intensa

  • Amostras mal acondicionadas

  • Tempo prolongado entre coleta e análise

  • Uso de anticoagulantes inadequados

Por isso, sempre vale avaliar a qualidade pré-analítica junto com o resultado.

Ureia não diagnostica sozinha, ela orienta caminhos

Assim como outros marcadores bioquímicos, a ureia não entrega diagnósticos fechados de forma isolada. Ela aponta direções:

  • Perfusão renal

  • Estado de hidratação

  • Carga metabólica

  • Função hepática indireta

  • Risco de acúmulo de toxinas nitrogenadas

O valor real da ureia está na leitura integrada com creatinina, eletrólitos, gasometria, história clínica e estado nutricional.

Quando a ureia aparece elevada por desidratação, o que ocorre é uma redução do fluxo sanguíneo para os rins, diminuindo a filtração e favorecendo o acúmulo da ureia no sangue.

Nos casos de doença renal, a ureia também se eleva porque há comprometimento direto da taxa de filtração glomerular, impedindo a eliminação adequada dessa substância.

Já nas doenças hepáticas graves, a ureia tende a diminuir, pois o fígado perde a capacidade de converter a amônia em ureia de forma eficiente.

Em situações de dieta hiperproteica, a ureia pode se elevar mesmo com rins saudáveis, simplesmente pelo aumento do catabolismo de proteínas e da produção de resíduos nitrogenados.

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Ariéu Azevedo Moraes
Biomédico | Consultor em Análises Clínicas
Fundador da Pipeta e Pesquisa
Professor, pesquisador e criador de conteúdos educacionais em biomedicina
CRBM – 1ª Região | Desde 2004

Concluímos que: ureia não diagnostica sozinha, ela orienta caminhos

A ureia é um marcador bioquímico que conecta rins, fígado, metabolismo e estado de hidratação. Avaliar esse exame de forma isolada pode gerar interpretações equivocadas. Quando integrada à creatinina, eletrólitos e ao contexto clínico, a ureia se torna uma ferramenta poderosa no apoio diagnóstico e no monitoramento do paciente.

Referências

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